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27/08/2024 15:18:00
Paris 2024

Os pilares da estratégia que levou o judô brasileiro ao melhor resultado da sua história em Jogos Olímpicos

Gerente de Alto Rendimento da CBJ, Marcelo Theotonio, fez balanço do que considerou fundamental para a conquista das quatro medalhas em Paris 2024

Os pilares da estratégia que levou o judô brasileiro ao melhor resultado da sua história em Jogos Olímpicos
A campeã olímpica do judô em Paris 2024, Beatriz Souza, e o gerente de alto rendimento da CBJ, Marcelo Theotonio. Foto: Lara Monsores/CBJ

Os Jogos Olímpicos de Paris 2024 ficarão para sempre marcados como o melhor resultado olímpico na história do judô brasileiro. O ouro de Beatriz Souza, a prata de Willian Lima e os bronzes de Larissa Pimenta e da Equipe Mista igualaram as quatro medalhas de Londres 2012, até então, o melhor resultado do judô em Jogos. Mas, em qualidade, Paris superou Londres, onde o judô teve um ouro (Sarah Menezes) e três bronzes (Felipe Kitadai, Mayra Aguiar e Rafael Silva). 


Além disso, o resultado garantiu o Brasil em sua melhor classificação geral no quadro de medalhas, com o quinto lugar geral nas chaves individuais e o terceiro na disputa por equipes. Em Tóquio 2020, havíamos ficado em 15º lugar depois de dois sextos consecutivos em Londres 2012 e Rio 2016. 


Gerente de Alto Rendimento da Confederação Brasileira de Judô desde março de 2022, Marcelo Theotonio liderou uma grande reformulação no processo de formação da equipe olímpica de judô do Brasil neste ciclo para Paris 2024 e colheu os melhores resultados da história do país em diversos eventos nestes três anos. 


Abaixo, ele explica os pilares da estratégia que levou o judô brasileiro ao melhor resultado da sua história em Jogos Olímpicos e que manteve a modalidade como a maior medalhista olímpica do Brasil. 


Primeiros passos e investimento adequado

"O ciclo de Paris 2024 para o judô brasileiro começou com uma grande mudança no comando técnico da seleção principal com a chegada de três novos treinadores - Kiko Pereira, Andrea Berti e Sarah Menezes - e, em seguida, com mais uma mudança na gestão de alto rendimento, com a saída do Ney Wilson para o COB, que foi quando assumi a função e a responsabilidade de preparar e classificar a equipe olímpica de judô do Brasil para Paris 2024. Começamos esse novo ciclo buscando dar mais oportunidades de acesso à seleção aos atletas de todo o Brasil e agrupamos os atletas da seleção em zonas de investimento com níveis diferentes, fazendo o planejamento adequado para cada grupo: Atleta Elite (medalhistas olímpicos e mundiais), Atleta Internacional (medalhistas Circuito Mundial), Atleta Acesso e Atleta de Transição (Sub-23). Logo no primeiro ano desse projeto tivemos o melhor resultado em Mundiais fora do Brasil, com dois ouros, uma prata e um bronze, no Uzbequistão, em 2022. Em 2023, tivemos o melhor resultado da história em Jogos Pan-Americanos, em Santiago, e também conquistamos finais nos dois principais Grand Slam do Circuito, Paris e Tóquio. Eram indicativos de que estávamos no caminho certo para Paris. Na reta final do ciclo, já em 2024, focamos na lapidação do grupo de Elite e em classificar o maior número de atletas aos Jogos, além de buscar o maior número possível de cabeças-de-chave. Tivemos um cuidado muito grande com a saúde, tanto física, quanto mental dos atletas para que todos pudessem chegar aos Jogos na melhor forma. Assim, antecipamos a convocação olímpica para abril e demos tempo e tranquilidade para os atletas nessa fase final. Outro ponto fundamental foi o alinhamento constante do planejamento da seleção junto aos principais clubes do Brasil. Acredito que todo esse processo contribuiu para chegarmos à Paris com uma equipe homogênea em chances de medalha, o que foi concretizado com o melhor resultado da história do judô brasileiro em Jogos Olímpicos. Um desempenho espetacular com o ouro da Beatriz Souza, a prata do Willian Lima, o bronze da Larissa Pimenta e o bronze da Equipe Mista, coroando todo o time. Poderíamos ter chegado a seis medalhas em disputas de bronze definidas em detalhes com a Rafaela Silva e o Rafael Macedo. O resultado final colocou Brasil como a 5ª maior potência mundial no judô, o que era nossa missão no planejamento estratégico da CBJ. Além disso, dos três medalhistas no individual, dois eram estreantes em Jogos Olímpicos - Bia e Willian - e os três vieram das categorias de base da seleção. Ou seja, foram medalhas construídas pela CBJ a longo prazo com investimento robusto e certeiro na base até a transição para a equipe principal. 


Os protagonistas 


“Os atletas são os protagonistas do ciclo. Tivemos um ciclo complexo, com um calendário intenso que, em dado momento, dividiu-se em dois para a classificação aos Jogos Pan-Americanos. Isso exigiu muito dos atletas, da CBJ, da equipe multidisciplinar para que a gente conseguisse adequar esse planejamento da melhor maneira possível. E os atletas, realmente, se prepararam, foram gigantes e escreveram essa história sendo os principais protagonistas.”


Gestão participativa


“Sobre a gestão participativa eu volto lá atrás onde todos os treinadores, um por estado, começaram a desenvolver um trabalho conosco. A partir dali, estabelecemos um padrão de avaliação dos atletas, uma metodologia, sempre construindo em cima de debates entre os treinadores. Ao longo do tempo, isso foi discutido em reuniões de treinadores, do Conselho de Administração onde a gente tinha um plano X, com um problema apresentado, todos opinaram sobre soluções e, assim, começamos a construir o planejamento da CBJ para Paris 2024. Acredito que isso tenha sido muito assertivo. O nosso sistema foi construído em conjunto, a várias mãos e com um único objetivo: desenvolver o judô brasileiro.”


Planejamento Esportivo Paris 2024 


“Um ponto bastante assertivo do nosso planejamento esportivo para os Jogos Olímpicos acredito que tenha sido a antecipação da convocação olímpica. Nós estabelecemos como meta que os atletas tivessem a tranquilidade de ter quatro meses de preparação exclusiva para os Jogos. Dentro dessa antecipação, nós estabelecemos alguns objetivos que eram a preparação para os Jogos Olímpicos, a classificação para os Jogos Olímpicos e a questão estratégica para ser cabeça-de-chave. 

Dentro desses quatro meses, tivemos o Campeonato Mundial, que não foi nosso foco primário. Infelizmente, nós não tivemos medalha, mas atingimos outros objetivos, como a classificação das categorias 60kg, 63kg e 48kg. Alguns países tradicionais que focaram no Mundial, como Itália e Holanda, que foram muito bem no Mundial, não performaram tão bem em Paris. A Holanda saiu sem medalha de Paris depois de fazer uma campeã do mundo e outras medalhas em Abu Dhabi. Assim como a Itália, que teve três medalhas mundiais e, em Paris, só teve uma. Então, acredito que a nossa antecipação com foco na preparação e participando das competições seguintes como estratégia de preparação também foram importantes na nossa trajetória dos Jogos. 


Outra medida que tem a ver com a antecipação foi o planejamento individualizado para cada atleta. O planejamento da Bia, por exemplo, foi totalmente diferente do planejamento do Michel Augusto. Ele precisava de uma sobrecarga maior, enquanto a Bia foi em eventos selecionados. A gente construiu isso com os próprios atletas e com seus treinadores nos clubes. E o papel dos clubes nessa fase final foi preponderante, pois os treinos nesses quatro meses foram concentrados nos clubes de cada atleta. Os treinadores dos clubes fizeram um trabalho excepcional junto com os treinadores da seleção, que também passaram um período junto aos atletas em seus clubes na reta final e deixaram todos na melhor forma possível para chegarmos à Paris com uma equipe preparada e forte.”


Bolha Ambiente harmonioso 


“Por fim, já na reta final, o nosso período de aclimatação na cidade de Sainte-Genéviève-des-Bois foi outro fator crucial. Entendendo que os Jogos Olímpicos têm esse cenário de muita pressão, muita visibilidade, nós tentamos criar nossa bolha de concentração. Nossa palavra de ordem lá era harmonia. Qualquer problema que aparecesse não poderia chegar ao atleta. A comissão técnica e nós, na gestão, seguramos e lidamos com esses problemas concentrando as tomadas de decisão da melhor forma para não atrapalhar a preparação. Acredito que isso tenha sido fundamental para criarmos um ambiente harmonioso e mais leve para que os atletas pudessem focar só no que importava para eles. 

Tivemos também a equipe de apoio que conseguimos convocar depois de muita discussão interna, realmente atendeu às necessidades de treino dos nossos atletas olímpicos, cumprindo um papel super importante, entregando o melhor deles aos atletas que lutariam nos Jogos.” 


Um ciclo de recordes e resultados históricos 


“Foi uma honra muito grande estar à frente, junto com a CBJ, desse planejamento. Foi construído a muitas mãos, com apoio irrestrito do Comitê Olímpico do Brasil, das Federações, Clubes e eu me vejo com um representante desse time que construiu o melhor resultado da história do judô brasileiro em Jogos Olímpicos. É uma experiência que a gente tenta visualizar, a gente pensa, se dedica a vida inteira para viver um momento como esse e realmente foi muito especial. Não só nos Jogos Olímpicos, mas o ciclo foi muito especial. Tivemos resultados grandiosos, como o Campeonato Mundial de 2022, que foi o melhor da história em mundiais fora de casa; tivemos o melhor resultado da história em Jogos Pan-Americanos na edição de Santiago, em 2023; e finalizamos esse ciclo, em Paris, com o melhor resultado da história do judô brasileiro em Jogos Olímpicos. Isso eu correlaciono à construção que já vem de anos no judô brasileiro e que, todos que integram nosso sistema, tiveram alguma contribuição relevante. 


Agradeço ao Presidente Silvio Acácio pela confiança nesse momento tão importante na vida de todos nós judocas.”

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